Quem me conhece sabe que eu tenho uma língua muito afiada para tirar sarro de Mercedes Benz. Tendo nascido e sido criado próximo à BMWs, era justo que fosse a consequência natural das coisas.
Quando o assunto era o duelo das duas preparadoras in house dessas montadoras, AMG e ///M, então, as gozações atingiam um outro nível. Em linhas bem gerais, eu adorava tirar sarro dos câmbios automáticos e falta de sensibilidade na tocada das AMGs. Porém, em meados de 2008, as coisas tomaram um novo rumo para os meus preconceitos contra AMG.
Foi quando conheci a C63 AMG. Pela primeira vez, eu podia encher minha boca para dizer que havia me divertido a bordo de um Mercedes Benz. Um paradigma havia sido rompido. AMGs, além de muito fortes, a partir de 2008 passaram a ter carisma e identidade únicos. Veio a minha chance de dirigir a SLS e, muito embora eu não tenha sido um grande admirador das aptidões dinâmicas do carro, até hoje me lembro com muito “carinho” da personalidade do carro.
O curioso sobre a AMG de 2008 para cá é que a cada novo produto, você nota que a marca está realmente empenhada em aprimorar. Se antes palavras como precisão, dirigibilidade e envolvimento com o motorista passavam longe na descrição de um AMG, creio que podemos definitivamente afirmar que os rumos mudaram. Se a BMW tirava sarro do 6.2 V8 aspirado com seu altamente emocional 5.0 V10 aspirado, na era dos sobre-alimentados, não há como negar que a Benz está na frente com seu 5.5 V8 Bi-turbo.
Chame de downsizing, do que for… quando a Mercedes Benz anunciou o seu mais novo produto AMG de entrada, equipado com um singelo 4 cilindros, 2.0, não tinha como não ser cético. A marca notória por capacidade cúbica inventando moda nos 4 cilindros? Ainda mais no veículo mais estigmatizado de sua história, o classe A? Pois é, são reviews como o que vocês estão lendo que servem para provar que, às vezes, nos enganamos.
MOTOR E CÂMBIO
O A45 AMG vem equipado, como já disse, com um 2.0 Turbo de 4 cilindros. Até aí, nada demais. A Audi e a Volkswagen já brincam nesse terreno há muito tempo. O “X” da questão é que algum lunático na Mercedes AMG resolveu que seria bacana ter o 4 cilindros turbo mais forte do mundo a sair de fábrica em série. O resultado são 360 Cvs e 45,8 Kgfm de torque.
Antigamente (digamos: há uns 5 anos atrás), isso era meio que o sonho erótico de muito preparador por aí e o resultado, normalmente, era um 4 cilindros que rodava “gordo” (com excesso de combustível), com uma marcha lenta bem zoada e um notável turbo lag.
Em 2014, a bordo de um Mercedes Benz A45 AMG, isso significa um carro tão normal quanto qualquer carro de passeio, até a hora que você cutuca o pedal da direta.
O câmbio, como diz a Mercedes, é de dupla embreagem, com 7 marchas, chamado de AMG Speedshift DCT. Você pode optar por três modos de condução: (i) o “eco-chato”; (ii) o esporte, reservado para aqueles com o mínimo de intimidade com trocas manuais; e (iii) o manual. Antigamente, se você quisesse ver seu AMG performar, o negócio era optar pelo esporte e deixar o câmbio trabalhar sozinho (pesadelo da SLS eram as trocas manuais). No A45 AMG, pela primeira vez em um AMG, pode-se abrir o sorriso, pois as borboleta não estão de folga! Elas prestam para alguma coisa!!!
Nas subidas de marcha, o câmbio responde muito bem aos comandos na borboleta da direita. Nas reduzidas, entretanto, algum alemão dormiu com a “bunda descoberta” e resolveu que, para poupar o motor, a borboleta da esquerda só obedece aos comandos do motorista quando do giro cai abaixo de 4000 rpm. Não vou dizer que é tão envolvente como o câmbio M-DCT da BMW ou um PDK da Porsche, mas é BOM. Não compromete nem um pouco a experiência a bordo do A45 AMG.
CHASSI, TRAÇÃO E SUSPENSÃO
AMGs nunca esconderam ser um pouquinho gordas. Porém, não há como negar que a marca está realmente se empenhando em melhorar nesse aspecto (BMW, está ouvindo?). Quando você bota na equação: tração integral + dupla embreagem + AMG, era de se esperar um carrinho pesado do A45 AMG. Curiosamente, a Mercedes Benz diz que o A45 AMG pesa apenas cerca de 1550 Kgs. Nos tempos modernos, um carro com tanta eletrônica e recursos pesando menos de 1600 Kgs é motivo para comemorar.
Mas não é só isso. A Mercedes Benz fez um trabalho genial com a suspensão e chassi do A45 AMG. Vejam: o carro vem equipado com rodas aro 19 e precisa ter uma suspensão que seja condizente com a força do carro. Se você deixar sua A45 AMG no modo “conforto”, ela roda com muita tranquilidade por ruas muito esburacadas, daquelas que fariam seu Mini Cooper correr de medo de tantas irregularidades.
Se você resolver apimentar as coisas e selecionar os modos mais esportivos de condução, pode deixar que a suspensão vai dar conta do recado. Juntamente com a tração integral, o A45 traciona com uma eficiência fenomenal mesmo sobre as piores ruas. Você nota que esse carro é o típico resultado do desenvolvimento de milhares de horas em Nurburgring, coisa até então reservada para os BMWs ///M. O carro realmente foi pensado em que curte acelerar naquelas estradinhas vicinais com asfalto irregular.
A “TOCADA”
Ao sair para dar um volta, estava no modo conforto e estava tudo tão civilizado e silencioso. Um pouquinho mais “seco” sob asfalto irregular das ruas de São Paulo comparativamente, por exemplo, a um Mercedes Benz Classe C. As trocas de marchas suaves e tranquilas. A direção leve. Tremenda versatilidade. Os bancos firmes, mas confortáveis. Observava o acabamento com enfoque na esportividade do modelo, com aplicações que parecem fibra de carbono. Até aqui, uma experiência bem Mercedes e pouco AMG.
Assim que o primeiro espaço abriu, modo esporte acionado…
Sem titubear, o A45 AMG parte como um petardo. Juro que tentei sentir um turbo lag, mas se ele estava lá, não fez questão de se fazer notado. O carro engole asfalto com uma voracidade medonha. Ele gruda… traciona, traciona e traciona mais um pouco. Queria dizer que lembra um Subaru WRX, mas não é nada parecido. O conjunto suspensão, tração integral e câmbio de dupla embreagem do A45 AMG são brilhantes – é um carro sob trilhos! Pneus cantando? Direção puxando para algum lado (torque steer)? NADA! Preciso! É apontar e acelerar para que o A45 AMG parta na direção escolhida com uma eficiência MEDONHA, tudo isso presenteado por “pipocos” agressivos vindos do escapamento a cada troca de marcha. Aliás, esses “pipocos” substituem até que bem aquele ronco agressivo dos AMGs maiores.
O controle de largada (race start) é libidinoso de tão legal. A “patada” do A45 é estúpida. Difícil mesmo explicar com palavras. Está entre uma das sensações mais legais que já senti numa arrancada. É forte a ponto de você achar que em algum momento os eixos vão sair correndo, deixando a carroceria jogada para trás.
Chega a hora de umas curvinhas mais fechadas. Com meu amigo no volante, vejo ele apontar a direção para esquerda e dar acelerador. O carro segue travado na trajetória selecionada. Na hora pensei, “balela, ele deve ter aliviado em algum ponto”. Alguns instantes mais tarde, foi a minha vez de fazer a mesma coisa. Fiquei esperando o momento que o controle de tração ou frenagem iriam resolver as coisas para mim. Surpreendentemente, não vi nenhuma luz acender escandalosamente no painel me avisando “pare de fazer M****, seu idiota“, mas nada. O carro tem conjunto de sobra.
Quando comecei a cutucar o A45 AMG para ver se ele gosta de sair de frente ou de traseira, descobri o quão neutro o go kart da Benz é. Meu amigo adiantou que a tendência é que saia de frente, mas no trecho testado, mesmo virando a direção e dando acelerador, a única característica notável foi a precisão com a qual o carro assumiu a trajetória que eu escolhia. Esse é um carro seriamente pensado em lhe levar do ponto A ao ponto B da maneira mais precisa e afiada possível! Quem diria, um AMG assim?!
CONCLUSÃO
Apesar de ter sido um teste muito breve com o carro, foi o suficiente para me surpreender em muitos sentidos. O primeiro deles é com relação ao que deve vir das próximas AMGs. Realmente, a concorrência precisa acordar e se mexer. Foi-se a época em que se podia tirar sarro das AMGs e sua falta de precisão no volante. Se o câmbio do A45 AMG passar a ser o padrão, a experiência vai ser muito mais rica de agora em diante. Fico imaginando o que seria da SLS se o seu câmbio tivesse a calibragem do A45 AMG.
O segundo motivo da minha surpresa é que o A45 AMG é possivelmente o hot hatch mais competente que eu já dirigi. Essa “coisinha” AMG é rápida para padrões que ultrapassam em muito a sua própria categoria. É um carro seriamente rápido… não apenas do tipo rápido comparativamente a outros hatches apimentados, mas sim rápido comparativamente a carros seriamente consolidados como esportivos. Pelo menos até por volta dos 160 Kmh, eu lhes asseguro que esse pocket rocket vai segurar a onda contra muita gente que custa até mais de duas vezes que o preço anunciado até o momento para o modelo (R$ 260.000,00).
A tração integral é um requisito necessário hoje em dia. Não consigo imaginar um carro com a quantidade de torque do A45 AMG sendo apenas um tração traseira. Infelizmente, nem todos atrás do volante de esportivos modernos são super heróis com habilidades e reflexos extremos. Isso me traz a uma comparação meio tosca, mas que, pensando bem, é mais do que aplicável: pense no A45 AMG como um Mini Nissan GTR em termos dinâmicos. Não importa o asfalto ou ocasião, se você pressionar o pé da direita, o Benz vai lhe “arremessar” na direção desejada com aquela frieza e precisão incríveis do GTR (ressalvadas as devidas proporções). Suba no freio e ela vai interromper tudo sem a menor cerimônia – aliás, arrisco até a dizer que os freios do A45 AMG são um excesso de tão bons.
Agora, talvez essa precisão seja, talvez, um “calcanhar de Aquiles” do A45 AMG. Não que ela não seja um “drivers’ car”, mas é que o carro é tão impecável na forma como ele despeja sua força e segue na direção pretendida que ele não lhe deixa ser um imbecil atrás do volante, como você seria, por exemplo, a bordo de uma BMW 1///M brincando com aquele câmbio manual e a aquela tração traseira. São públicos distintos, mas suspeito que muitos “retardados mentais” como eu gostariam de ter mais liberdade para brincar com o carro de vez em quando. O A45 AMG vai estar lá com uma palmatória cada vez que você tentar fazer um “pirocóptero”.
Tirando isso, se tivesse que apontar mais um singelo problema com o A45 AMG seria a direção. Apesar de extremamente direta, ela ainda é demasiadamente leve. Tirando isso, difícil arrumar problemas com o A45 AMG. É assim bom.
Em muitos aspectos, é um carro que se aproxima muito mais da ideologia do Audi RS3 do que do BMW 1///M, ambos que já saíram de linha. Porém, comparativamente ao Audi, é como se a Mercedes tivesse pegado tudo de errado com o RS3, aprimorado até a exaustão e ainda fizesse mais rápido.
Caro Korn, excelente post!
Sou fã de um bom hot hatch, pena que meu bolso não alcance essa possibilidade, mas é uma seria concorrência essa AMG .
Quanto a BMW 1M que vc acabou citando aq no post, eu até cheguei a escrever no youtube que me surpreendi dele não ter entrado na sua lista de usados na faixa dos 200 mil!
De modo geral gostaria de saber a sua opinião a respeito da 1M, é um carro possível de ser de uso diário? A embreagem é muito pesada?
Sempre sonhei com esse carro e quem sabe quando virar um pouco mais “resto de rico” encontrando em boas condições eu levo uma para minha garagem.
abs
isso sim, um bom carro para o dia-dia e para quem quer brincar nos fins de semana
Ótimo texto, primeiro que leio neste blog, se a média for assim, serei um leitor assíduo.
Sucesso!