O mercado de veículos semi-novos brasileiro é peculiar. Vê-se de tudo.
Há sempre aquele vendedor que anuncia um super-esportivo como “veículo de final de semana, usado somente em estrada e único dono“, apesar de saber-se notoriamente que o carro já teve outra cor e que foi agressivamente batido.
Há também a mítica fronteira dos 100 mil km rodados, que parece nunca ser ultrapassada por nenhum veículo semi-novo. Nada como o bom e velho túnel do tempo.
Não é estranho que na literatura econômica o mercado de veículos usados seja um exemplo clássico utilizado para explicar a questão da assimetria informacional – em curtas palavras, o vendedor sabe mais sobre o que vende do que o comprador. Isso lhe confere uma vantagem muito grande em qualquer negociação.
Porém, nem tudo são lágrimas. Há pessoas, de fato, honestas e que procuram manter seus carros em bom estado de conservação e manutenção. É isso que nos traz ao tema desse texto.
O histórico de manutenção de um veículo usado é condição essencial para uma boa compra. Porém, nem sempre um manual de revisões carimbado do começo ao fim é uma coisa positiva.
Ok, nem todo mundo que compra um carro está realmente interessado em saber os detalhes de como a máquina funciona ali debaixo do capô ou está focado em ouvir “grilos” ou barulhos estranhos. Para o ser humano comum, longe de ser um Petrol Head, as revisões periódicas estão aí para que não seja necessário ter esse tipo de preocupação.
No entanto, cada veículo tem seu público distinto. Carros esportivos ou luxuosos, naturalmente, deveriam atrair um público comprador mais interessado em saber onde enfia o suado dinheiro. Na teoria, pode ser verdade. Na prática, não é bem assim.
O que é uma concessionária? Uma “trocadora de peças“. Enquanto o carro está em garantia, faz sentido recorrer aos seus serviços, pois o proprietário não bota a mão no bolso, muito menos a concessionária, que é reembolsada pelas peças de reposição substituídas em garantia. Se fosse tão simples assim, esse texto acabaria por aqui.
O problema mesmo é que essa característica tem efeitos colaterais. O principal deles é que a mão de obra empregada pelas concessionárias é, via de regra, extremamente mal remunerada e com pouca (ou nenhuma) experiência. É aí que mora o problema.
Baixos salários, pouca experiência e pouca informação são sinônimos de despreparo na hora de encostar a mão no seu carro. Sim, as montadoras realizam treinamentos para seus funcionários, mas muitas vezes esses giram ao redor de manutenções básicas.
Se você tem um carro de uma marca, que é mais antigo ou muito específico, fora de garantia, considero um pouco “temerário” confiar cegamente no serviço das concessionárias.
Parafraseando as palavras de um gerente de uma concessionária de uma marca renomada aqui em São Paulo (cujo nome não vou divulgar) ao ser indagado sobre um pequeno defeito em uma das travas da porta de um carro com 12 anos de idade: “Cara, a única solução que eu tenho para você quanto a isso é trocar a trava toda. Honestamente, os meninos desmontaram a porta para ver do que se trata e não tinham a mínima ideia do que estavam vendo.”
Então, qual a solução?
Eu sou partidário da seguinte estratégia:
1 – Antes de comprar um carro, especialmente um importado esportivo ou de luxo fora de garantia, informe-se a respeito de problemas comuns e defeitos. A sua maior amiga nessa empreitada é a INTERNET!
Infelizmente, as fontes de informação aqui no Brasil são extremamente escassas. Os fóruns brasileiros específicos de marcas são um bom ponto de partida, mas sou da opinião que brasileiro não gosta de ler, muito menos gosta de escrever de maneira clara, então, há muita informação confusa e truncada por aí. Em alguns casos também parece ser tabu falar de defeitos de um carro, especialmente se você tem o modelo na garagem.
Sua melhor opção são os fóruns gringos. Lá fora o pessoal não tem papas na língua para falar de problemas enfrentados, adora entrar em detalhes e muitos botam a mão na massa. Termos como “common maintenance issues“, “reliability problems” etc., seguidos pelo modelo específico do carro vão lhe dar uma tremenda visão.
O lado negativo dos fóruns gringos, no entanto, é que há muito exagero e como os problemas ficam concentrados, você acaba tendo a impressão que está indo atrás de uma “bomba”.
No final do dia, informação é a chave para curtir o seu sonho automotivo. Saber dos problemas e soluções é um ótimo ponto de partida para evitar ter que confiar demasiadamente em qualquer mecânico.
2 – Encontre uma boa oficina especializada naquele modelo de carro que lhe interessa. Muitas vezes, até mesmo a melhor oficina, com a reputação mais ilibada possível, pode não conhecer muito bem a respeito de um modelo específico. O resultado, geralmente, é uma conta muito salgada ou um serviço que não atende às expectativas.
As oficinas mais generalistas (e boas) vão lhe dizer o estado geral do carro, se há algum esqueleto no armário e se o carro está em boas condições. Para reparos mesmo, eu sempre prefiro o especialista, o cara que tem tesão no carro em questão.
3 – Faça uma revisão pré-compra! Por mais recheado de carimbos de concessionária que um carro esteja, eu não confio. Procuro uma das oficinas que reconheço o trabalho como honesto e qualificado (até mesmo as oficinas mais generalistas) e peço uma inspeção detalhada.
É nessa hora que você pega se o carro foi batido e eventuais “porquices” de manutenção! É geralmente daqui que você também tira a base para fazer uma proposta sincera e honesta de compra de um carro. Se o vendedor se recusa a aceitar esse tipo de solicitação, na minha opinião, está escondendo alguma coisa.
Toda vez que um amigo me pede uma ajuda e me conta que loja X ou vendedor Y se recusarou a autorizar uma revisão pré-compra eu simplesmente digo para não fazer negócios e procurar outra oportunidade.
Aliás, essa é, sem dúvidas, uma das razões de vocês verem tantos carros à venda por tanto tempo no mercado. Preço elevado é certamente a razão número 1. Porém, carro cujo vendedor se recusa a autorizar esse tipo de inspeção é algo que espanta qualquer comprador.
Portanto, como vocês podem ver, ter um carro dos sonhos é muito mais do que simplesmente ter dinheiro. Ninguém gosta de ver o sonho virar pesadelo. É preciso ser diligente e pro-ativo para curtir o brinquedo em solo tupiniquim. Em tempos de dólar a 3 reais, com entraves cada vez maiores à importação de peças e mão-de-obra cada vez mais cara (porém não mais qualificada), agir dessa forma é a única maneira sensata de comprar um carro de alto padrão.
Korn, e se estou interessado em um carro cuja sua cidade está distante da minha, como devo proceder em relação a oficina para inspeção pré-compra pois nesse caso não terei conhecimento de qual oficina é boa?
É aí que você bate num ponto muito interessante e uma das razões do pq carros fora dos grandes centros urbanos tendem a sofrer na venda. Ou você manja muito de mecânica e viaja até o local… ou simplesmente desencana. Eu mesmo já estive nessa situação e deixei de comprar carros bons por causa disso.
Korn, já te acompanho faz um bom tempo nas mídias sociais e amigos por carros, principalmente pela afinidade por Porsches.
Estou em uma fase de pre-compra, analisando muitos carros e esperando pelo momento e carro certo (911-Cayman 2009-2014). Fase essa aliás muito boa, pois temos o poder de decisão nas mãos (boa e perigosa na verdade hehehe).
Minha maior dificuldade é exatamente saber quais as alternativas de oficinas em São Paulo seriam boas para inspeção pre-compra e posterior manutenção (vejo e leio muitas opiniões contraditórias). Será meu primeiro carro esportivo então já imagina minha preocupação. E tem mais, não faço (no momento) parte deste meio cool-alternativo-com-amigos-influentes-de-carros, por isso tudo é muito novo para mim.
Quais seriam suas indicações / sugestões a respeito? Sei que tudo é muito pessoal, mas quais foram suas experiências positivas que poderia recomendar?
Parabéns pelo trabalho.
Tá cheio de boas oficinas! Eu recomendo a Pitstopshop, que também é patrocinadora do Amigos por Carros.