– Chefe, aqui está. A minha visão para o futuro da nossa linha de carros.
– Um adesivo com a palavra “Sport” escrito vermelhor e laranja!? Ah, entendi, é uma simbologia para dizer que precisamos entrar no segmento de esportivos. Mas você sabe que nós não temos dinheiro, tão pouco know how e muito menos o menor interesse em tirar nossos glúteos da cadeira para fazer isso, não sabe?
– Claro, foi a primeira coisa que me ensinaram quando eu comecei a estagiar no departamento de projetos, há 10 anos atrás. Mas este adesivo não é uma metáfora para falar de um projeto. Ele é o projeto.
– Quer que comecemos a fabricar adesivos?
– Não. Vamos produzir séries esportivas especiais.
– Você estava na sala quando eu disse que a gente não tem nem dinheiro nem know how para fazer carros esportivos?
– Perfeitamente, senhor. Mas a grande sacada é que nós vamos vender para o público que também não tem nem dinheiro nem know how para ter carros esportivos.
– Tô te ouvindo.
– É simples. O carro sai da linha de montagem, a gente retira o papel no verso do adesivo expondo a parte colante e o posiciona na traseira do veículo.
– Não vai colar.
– Vai sim, o adesivo é de primeira.
– Quis dizer que só um adesivo escrito “Sport” não vai deixar o carro esportivo.
– Exatamente. Por isso nós desenvolvemos estes outros adesivos escuros para colocar dentro do farol e deixar o visual mais agressivo. Batizamos de mácara-negra. Parece nome de inimigo do Homem-Aranha. Radical, né?
– Não vai adiantar. É um carro de 124 cavalos com câmbio automático de 4 marchas e não podemos melhorar isso.
– Já pensamos nesse problema também e criamos este incrível kit de saias laterais e aerofólio traseiro.
– Aumentar o arrasto de um carro que faz de 0 a 100km/h em 12,7 segundos vai deixá-lo ainda mais lento.
– Pense. Você quer que as pessoas o vejam num esportivo e o admirem por isso, o que escolheria: passar na frente delas a 300Km/h como um flash ou devagarzinho com a bração pra fora da janela e o som tocando Michel Teló no último volume?
– Até faz sentido. Mas não sei. Não consigo me convencer de que apenas isso fará as pessoas pagarem a mais por este carro.
– Sei que o senhor é um homem exigente. Por isso, guardei a melhor idéia do nosso para o final. Faremos uma saliência no meio do capô, como se o motor fosse tão grande que a tampa precisou daquela protuberância para poder fechar.
– É um motor de 1800 cilindradas sem turbo com comando de válvulas simples. Tem espaço para ele e as compras do supermercado lá dentro.
– Vou contar um segredo para o senhor. Às vezes, quando saio à noite, costumo enrrolar uma meia e colocar na minha cueca para criar um efeito parecido. E sabe o mais incrível? Funciona. Usando este artifício obtenho, em média, 46% mais sucesso com as mulheres.
– Mas e quando elas descobrem?
– Aí, já é tarde, senhor.
– Ainda não acho que isso vai convencer alguém a pagar mais.
– Vai sim. E pra completar, a gente faz uma propaganda que sugira que ele é rápido sem sequer precisar mostrar performance. Afinal, mesmo que ele fosse, é proibido pelo Conselho de Auto Regulamentação Publicitária ultrapassar o limite nos comerciais. É perfeito!
– Ok. O carro vai parecer esportivo, mas quando as pessoas forem pisar no acelerador vão descobrir que ele é, na verdade, um tremendo sedentário.
– Aí, já será tarde, senhor.